quarta-feira, 31 de agosto de 2011

NUNO FÉLIX DA COSTA

A FADIGA DA INEVIDÊNCIA


Cansa-me escrever um poema e bem podia estar
a fazer outra coisa mais muscular ou libidinosa
mas uma parte da alma anseia por coisas indefinidas
quer o absoluto – medi-lo com gigantescos

números – Estes contêm o anulamento entre as propriedades
mais activas – Escrever um poema com músculos e libido
ou juntar estrelas avulsas desenhando as constelações
no firmamento são actividades da vontade

facultativas – mas escrever um poema sem estrelas
nem sonho nem libido nem a energia heróica
da sobrevivência é apenas escrever para tentar

que o poema seja escrito e contenha algo do silêncio
ou do que sobeja da frustração do absoluto se escapar
e deixar-nos a sua quase-evidência


Catálogo de soluções, Cortex Frontal, Lisboa, 2010.