PERGUNTAS
Alguém me permitiu que chegasse a esta idade
fazendo perguntas. Boa alma, essa
que leu em mim o aguilhão das dúvidas
e o achou legítimo e me permitiu que às vezes
fizesse umas perguntas de trazer por casa.
As outras perguntas, as menos correntes,
aquelas a cujo cofre só sábios têm acesso
(e para as quais aliás nunca encontram resposta,
tal qual eu para as minhas – estou vingado),
essas foram-me escondidas
como de uma criança o frasco da compota.
Ainda assim, impostos dessa forma
limites aos meus passos inquietos,
agradeço o benefício. Porque enfim
podia ter nascido sem a urgência
de inquirir coisa nenhuma.
Podia dar-me por satisfeito assim,
aninhado numa rábula qualquer.
Ronronar como um gato que o dono afaga
maquinal atrás da orelha enquanto lê.
Com acesso garantido a um lugar de balcão
com vista para a bem-aventurança.
Cobra-d'água, Cotovia, Lisboa, 2011.
Há 3 horas