[DEIXEM-ME, AO MENOS, O SILÊNCIO]
Deixem-me, ao menos, o silêncio,
o lugar vazio onde morrer sozinho,
ou junto dos que a morte – a escuridão –
levou antes que a vida mos tirasse.
Não dancem derredor da minha gruta,
tugúrio imperial atapetado
de ervas daninhas ou flora intestinal,
cilícios naturais da minha seita.
Creio-me Deus, como sempre me cri,
e um gajo porreiro em cima disso,
pastor de gatos pardos violentados,
enquanto estes me querem a seu lado,
e ao meu cajado que sabemos manso.
As minhas Regras, monge macambúzio,
são poucas e são simples; o teatro
da ordem imperando sobre o vento;
a ocasional sandes de couratos;
e o vinho esfoliando a pele do Tempo.
Do Amor nada sei, fui sempre só,
excepto por transcendência imerecida:
houve quem me escutasse antes da ida
para outras freguesias, mais amenas.
Sou eu que salto (janela sem moldura)
para fora do tempo em que me movo,
por tanto me agredirem a alegria
e a liberdade dos que se crêem corças
(outros leões, protozoários, ratos),
dos que se crêem aqui e aquém do Mundo.
Do Amor nada sei, sabei-lo bem.
A metafísica das t-shirts brancas, Edições 50 Kg, Porto, 2012.
Há 5 horas