domingo, 18 de novembro de 2012

JORGE ROQUE

CÍRCULO


Temos de confiar nas pessoas, afirmava o meu pai, perante as objecções da minha mãe que eram muitas e fundamentadas, e eu criança pouco entendia, embora me sentisse inclinado a defender o meu pai contra as armas e razões da minha mãe, talvez porque na sua eloquência a minha mãe ganhasse clara vantagem e eu nutrisse simpatia pelos derrotados, ou simplesmente porque o gene se tivesse cumprido e eu na minha crença insensata repetisse o meu pai.
 
Quanto mais sofro por viver de coração aberto, é o que desta memória hoje se ilumina, mais me reconheço nas palavras do meu pai. Quanto mais envelheço, mais me aproximo do lugar que deixou vazio.


Cão Celeste, n.º 2, Lisboa, 2012.