domingo, 7 de janeiro de 2018

MIGUEL MARTINS

[NÃO, NÃO SÃO OS POEMAS QUE ME INTERESSAM]


Não, não são os poemas que me interessam,
mas os poetas, os gritos noite dentro,
a casa que é alheia e se faz minha,
seja defronte ou em Paris ou mesmo
numa centúria distante e repintada.

O Alex esconjurando a impotência,
o Silva Ramos engravatando o vinho,
o Mário Alberto apostrafando as pedras
da Avenida, ou o sagaz mendigo
da Nazaré, todo onomatopeias.

Não, não há verso que luza mais afoito
do que a rosa de crepe num bordel
quando a comeste, com sal e pimenta,
e recitaste, com pompa vitoriana,
o preçário, tal fora a nossa vida.


O caçador esquimó, Fahreneit 451, Lisboa, 2017.