sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

MANUEL DE FREITAS

UM ÚLTIMO NOME

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Eu dantes escrevia poemas, como diria Karen Blixen da sua quinta em África ou Álvaro de Campos do dia do seu aniversário. Os versos tornaram-se-me prosa baça, apontamentos, meros diálogos ou evocações. Evito metáforas e ardis retóricos como quem evita aviões ou eléctricos cheios de ninguém. Custa-me, por vezes, reconhecer a cidade onde decidi viver.

Falar da morte — sempre foi isso, creio, a minha poesia. Embora, tenho de acrescentar, nunca apenas isso. Entre mim e o suicídio interpôs-se, por exemplo, a Paixão segundo São Mateus de Bach. Posso dizê-lo, agora que já não me vou matar mas irei certamente morrer. Eu que talvez nunca me tenha querido matar, mas que precisei tanto da certeza de o poder fazer.

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Junto ao chão [com Carlos Nogueira], Capela do Rato, Lisboa, 2018.