domingo, 3 de janeiro de 2010

RUI PIRES CABRAL

O CÉU VISTO DE CIMA


Tu já estavas prometido à tristeza
da cidade mais pequena, mas a noite
tinha passagens secretas, bastava seguir
os sinais.

A sombra de um réptil avançava muito fundo
nos teus estratos, tacteavas num território de pedras difíceis,
às vezes perigosas. Depois imergias e a boca estava
amarga outra vez, a roupa amontoada na cadeira
como o princípio de um poema indesejado.
Reflectindo nos teus olhos, o céu
era um lugar inabitável.


El arte de la pobreza: Diez poetas portugueses contemporáneos [de A super-realidade], org. José Ángel Cilleruelo, CEDMA, Málaga, 2007.